Incêndio atingiu galpão da instituição na Vila Leopoldina nesta quinta-feira (29). Em audiência com o governo federal, há 9 dias, Ministério Público Federal alertou para risco de incêndio. Em 2020, alagamento danificou acervo no mesmo endereço e, em 2016, outro incêndio ocorreu na sede, na Vila Mariana
O incêndio em um galpão da Cinemateca de São Paulo, na noite da última quinta-feira (29), destruiu mais de quatro toneladas de documentos que registravam a história do apoio governamental à cultura. A avaliação é de Carlos Augusto Calil, ex-diretor da Cinemateca, em entrevista à CNN Brasil.
"Muito provavelmente perdemos toda a memória da atuação pública, do governo federal, na área de cinema desde 1967, desde a criação do Instituto Nacional do Cinema. Depois, esse instituto foi substituído pela Embrafilme, [mais tarde] pelo Conselho Nacional do Cinema, que depois foram extintos pelo governo Collor, e foi criada uma Secretaria Nacional do Audiovisual", explicou ele.
Calil ainda disse que é possível que o incêndio tenha destruído equipamentos antigos e rolos de filme da coleção da Pandora Filmes, distribuidora paulistana com mais de 20 anos de atuação no mercado. Ele avaliou os efeitos do incêndio como desastrosos.
"Não tem mais memória da política pública de cinema do Brasil. Como essa política pública está desativada neste momento pelo atual governo, as coisas meio que combinam, no sentido de que o passado foi simplesmente eliminado, e o presente não existe”, refletiu.
Atuação dos bombeiros
Na manhã de hoje (30), o Corpo de Bombeiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo comunicou no Twitter os próximos passos no caso da Cinemateca.
A instituição disse que "abriu um procedimento de fiscalização com intuito de confirmação dos dados no sistema e aplicação das medidas contra incêndios", e que ainda fará uma vistoria de fiscalização no local.
Sucateamento
A Cinemateca é um órgão responsável por preservar a memória do audiovisual no Brasil desde 1940. Apesar de estar localizado em São Paulo, a gestão dela é de responsabilidade do governo federal.
Desde dezembro de 2019, ela está sem contrato formal de gerenciamento, obrigação da Secretaria Especial da Cultura do Governo Federal. Em janeiro de 2021, a Sociedade de Amigos da Cinemateca assumiu o gerenciamento do local até que uma empresa seja contratada.
Em 2018, o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, também pegou fogo e teve uma perda enorme em seu acervo. Segundo peritos, o fogo teve início devido a um mau funcionamento em um dos ares-condicionados do prédio.
Durante o Festival de Cannes deste ano, o cineasta Kleber Mendonça Filho falou sobre o estado da Cinemateca. Foi em resposta ao comentário do cineasta brasileiro que o diretor Spike Lee ainda teceu críticas ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
"A Cinemateca Brasileira está fechada há mais de um ano. 90 mil títulos, 230 mil rolos de filmes e fitas televisivas, todos os técnicos e especialistas foram demitidos e essa é uma clara demonstração do desprezo pela cultura e pelo cinema. E eu acho que devo mencionar isso porque estamos no Festival de Cannes e todos amamos o cinema aqui".
O incêndio que atingiu um galpão da Cinemateca Brasileira nesta quinta-feira (29), reacendeu a discussão sobre a crise que a instituição enfrenta há anos.
No ano passado, um temporal alagou o mesmo local e parte do acervo foi comprometido. Em 2016, um outro galpão da instituição, na Vila Mariana, foi atingido por um incêndio que destruiu cerca de 500 obras.
Além disso, funcionários da instituição foram demitidos em 2020 pela associação que mantinha a Cinemateca após o governo federal assumir a gestão do órgão e não repassar R$ 14 milhões em verbas à organização.
Veja os principais pontos da crise da Cinemateca Brasileira:
Incêndio em 2016: Em fevereiro de 2016, um incêndio afetou um galpão da instituição na Vila Mariana e destruiu cerca de 500 obras, mil rolos de filmes da década de 1940, incluindo originais das produções audiovisuais.
Alagamento em 2020: Em fevereiro de 2020, uma enchente alagou um galpão da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina e atingiu principalmente materiais como mobiliário, fotografias, livros e folhetos.
Abandono: Em julho de 2020, o Ministério Público Federal em São Paulo entrou com ação na Justiça contra a União por abandono da Cinemateca.
Troca de gestão: Entre julho e agosto de 2020, funcionários da Cinemateca Brasileira ficaram sem salários e, posteriormente, foram demitidos após o governo federal assumir a gestão. Funcionários e entidades realizaram diversos protestos denunciando o abandono do órgão.
Entrega das chaves: Em agosto de 2020, a Secretaria Especial da Cultura exige a entrega das chaves dos imóveis da Cinemateca para a antiga gestora, a Associação de Comunicação Educava Roquete Pinto (Acerp).
Nova direção: Em janeiro de 2021, a Sociedade Amigos da Cinemateca assume a gestão da Cinemateca Brasileira a partir de 15 de janeiro até que uma nova organização social assuma a administração.
Suspensão de ação do MPF: Em maio deste ano, a Procuradoria suspendeu o processo por abandono da Cinemateca após o governo federal se comprometer a mostrar ações em 45 dias, prazo vencido no início de julho.
Mais prazo e alerta sobre risco de incêndio: Em audiência em 20 de julho, a Justiça deu mais 60 dias para a União dar continuidade nas ações de preservação. Nessa audiência, o MPF alertou o governo para o risco de incêndio.
Fonte: CNN Brasil / G1
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